19 de agosto de 2009

A leitura ortodoxa é na verdade falsa e exclusivamente racional


Rubem Alves, em Religião e Repressão
"Ortodoxos são aqueles que tiveram poder político para impor suas definições. Ortodoxia, portanto, contém sempre as idéias dos mais fortes. Heresia, complementarmente, indica as idéias dos mais fracos. Não tiveram poder político para impor suas definições sobre a comunidade eclesiástica. A questão da definição da verdade, portanto, em última análise, é uma questão de poder.

Os protestantes afirmam que a sua última autoridade é o texto das Sagradas Escrituras. Diante das múltiplas leituras possíveis do texto foi necessário tomar uma decisão sobre a leitura correta. Isto se fez pelo estabelecimento de um texto: a confissão. Ato de natureza política, porque as leituras heréticas só eram heréticas do ponto de vista dos que tiveram poder para impor a sua interpretação. Do ponto de vista do herege, a sua leitura é a verdadeira – e, portanto, ortodoxa – e a leitura ortodoxa é na verdade falsa e, portanto, herética".


Rudolf Otto, em O Sagrado

"Diz-se que a própria ortodoxia é que foi a mãe do racionalismo. Esta afirmação encerra uma parte de verdade. O que há de verdadeiro nesta frase não é apenas o simples fato de a ortodoxia se ter proposto como objetivo a doutrina e o ensino doutrinário – os místicos mais inflamados também fizeram isto – mas sim o fato de não ter encontrado forma, no seu ensino, de salvaguardar o elemento irracional do seu objeto. Nem sequer soube mantê-lo vivo na experiência religiosa. Menosprezando-o, ela tornou a idéia de Deus exclusivamente racional".